Não há sol...não há mar...não há verão...
Não há em mim a euforia da luminosidade esperada...
não há a calma das ondas do mar...nem a espuma fresca perfumada a banhar-me os pés...
não há azul...não há fascínio
nem lua cintilante...nem me ofuscam as estrelas repetidamente procuradas...
E porque não há fascínio
permito-me transcrever uma passagem de um pequeno livro de Pedro Paixão, "Amor portátil".
"Uma pessoa não pode viver a vida de outra.
Por mais perto que esteja, por mais necessidade que haja, por mais vontade que tenha. Uma pessoa nasce separada de todas as outras, vive uma vida que é só dela e acaba por morrer no minuto de uma hora que lhe é destinada.
Não deixa de ser estranho apesar de não poder ser de outra maneira. E duas pessoas sozinhas não fazem uma pessoa acompanhada. Pelo contrário: a solidão de uma potencia a outra, como uma lupa, até ao fracasso. O fracasso aqui significa a desistência, o abandono, a busca de outra coisa..."
Ao transcrever este texto de Pedro Paixão não posso deixar de o fazer como um desabafo do que sinto...mas não sinto desespero ou tristeza, mas antes a incapacidade de contrariar alguma solidão que de repente me inunda sem a ela ter recorrido por necessidade...
tenho em mim um silêncio incompreensível...não o entendendo nem sei onde o encontrei...mas parece que o adoptei...
não há sol...não há mar...não há Verão...
apenas o silêncio da multidão que não olho...
não escuto...
Um destes dias despeço-me deste silêncio e mergulho no sol
no mar e vagueio pela multidão ouvindo e vendo o colorido próprio dos sonhadores...
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Medir o pulso à vida no dia 8 de Julho de 2009 - 3
Na memória não vislumbro registo do nosso primeiro encontro
vasculho...
remexo...
caminho na sombra de cantos para já irreconhecíveis
tacteio os puxadores das gavetas...
e sinto um odor conhecido...adocicado...alfazema
ao longe avisto uma ténue luzinha
que me indica um caminho...parece-me familiar
encontro-me agora com a luz trémula envergonhada
ou esquecida?
reconheço um berço e estou a embala-lo
tão suavemente...
estás lá...tão adormecido
e sorrateiramente rapino-te a chupeta
escondo-me a saciar esse prazer
só há esta chupeta
acordas e os teus gritos de falta de algo acordam-me destas lembranças...
Terá sido o nosso primeiro encontro...não sei
mas lembro-me deste
Afinal meu irmão já partilhávamos afectos
chupeta... olhares
mais tarde as brincadeiras
a tua bicicleta...a minha boneca
e assim continuamos esta partilha constante das nossas vidas
dividindo tristezas e alegrias
tudo o que a vida nos vai oferecendo...
e sendo vida
dá e tira numa dança incerta
descompassada...
mas o afecto
o amor
que sentimos um pelo outro equilibra o caminho de montanhas e planícies que atravessamos e continuaremos o nosso rumo...
Lembrei-me agora irmão que somos tão chegadinhos em idade que devíamos ter tido duas chupetas... a memória é o museu dos meus afectos...
Adoro-te irmão!
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Medir o pulso à vida no dia 8 de Julho de 2009 - 2
És a parte mais pura
mais profunda e bela da minha existência...
em ti tens ainda o menino que adocei de afagos...
hoje és o homem que cresceu com o carácter forte e inabalável
de um amor incondicional...
és o elo mais forte na cadeia dos meus sentimentos...do meu amor.
O de mãe!
(para ti, Rui)
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Medir o pulso à vida no dia 8 de julho de 2009 -1
Penetrei em mim mesma, liguei os fios condutores da alma ao coração e medi o pulso à vida...
"És a mãe, a mulher, a areia, a água, o cimento. A força! Assim, construíste o pilar sólido, firme inabalável em todas as tempestades...que tentamos a todo custo, ainda hoje manter tão rico legado que nos incutiste...e nem a ver-te lentamente a perder o sorriso, o vigor de outrora, nos demoves de continuarmos a pensar, que o teu amor, a tua dedicação, a tua presença constante te roubou a tua própria vida, de a viveres...anulando os teus sonhos acalentando os nossos...pintaste-nos a vida de muitas cores...mas a tua foi a preto e branco...tu sabes como tentamos todos os dias dar-te alguma cor...mas teimas em ver a vida cinzenta. Ajuda-nos a colori-la como fizeste com a nossa...deixa-nos fazer algo por ti!"
Obrigada mãe por me teres dado vida no dia 08/07/57.
(escrevi o que também vai no coração do meu irmão)
Continua...
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Momentos...
quantos momentos
só nossos...mesmo nossos
temos por dia...
e em muitos surgem súbitas palpitações
angústias...
solidão
outros são cristais coloridos que nos ofuscam os pensamentos
e de tanto brilho...inundam-nos de uma confusão estonteante
entre o prazer e a felicidade...
Momentos são
ilusão
desilusão
amor
desamor
mas são os nossos momentos... momentos
que nos enlaçam em nós mesmos...como hera em muro forte...
e permitem eliminar dúvidas do nosso espírito...
nos nossos momentos devemos aprender a viver o presente...
sem a nuvem densa dos desgostos e remorsos do passado...
O futuro está sempre depois...serão outros momentos...
permitamos a cada um de nós viver o presente...o momento
"O futuro nunca é senão o presente a pôr por ordem.
Não podes prevê-lo, podes simplesmente permiti-lo."
Saint-Exupéry